sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

24 horas são suficientes??



O despertador toca, são 5h25 da manhã, ainda esta escuro e frio, dormi menos de 4 horas e me pergunto - “Tenho mesmo que levantar?”. As próximas 30 horas vão ser longas e desgastantes, olho para o quarto do lado e vejo o Diego se levantando, escuto barulho no outro quarto e começo a escutar a voz da Cris - "Vocês não vão levantar não?", ela entra com o celular na mão tocando a trilha sonora do Rocky Balboa. Agora sim, Ultra 24h, lá vamos nós!

Saímos de São Paulo em dois carros, eu, Pedro, Ronaldo, Fabiana e nosso veganinho Venâncio, e no outro carro foi a Erika, Rafa, Cris, Diego, Julia, Digo e Rodolfo. Ao chegarmos em Valinhos encontramos o resto da família, Jhonatan, Ketilin, Bianca, Liana, Daniel, Eloisa, Maria Angela, José Luiz, Débora, Lucas e Celso. O nosso camping estava enorme e a energia a mil.

10 horas da manhã é dada a largada, começa a IV Ultramarathon 24hs Run de Valinhos, minha estratégia é correr uma hora e descansar uns 20 minutos para poder fazer mais de 100 km, a maior quilometragem que tinha feito antes foi 75 km. No começo vamos eu o Ronaldo e o Lucas, num ritmo calmo e sentindo a pista de 1,3 km. Depois de uma hora dou uma paradinha no banheiro, mas estou bem e resolvo continuar mais um pouco, depois de mais quinze minutos me avisam que o meu chip não estava marcando as voltas, caraca, devo ter feito uns 13km por nada, resolvo desencanar total da prova, e continuo correndo, com duas horas de prova e ainda bem passo pelo nosso camping, como algo rápido e vou embora, quer dizer minha estratégia inicial foi pra cucuia, agora é só correr.

Converso com o Ronaldo que me diz que também errou ao colocar o chip, mas conseguiu recuperar a metade das voltas com a organização, pensei - "vou lá chorar também", me devolveram 5 voltas, melhor que nada. Então resolvi fazer uma estratégia suicida, só vou parar para comer, trocar o tênis e massagem quando estiver crítico, quero ver aonde vai o limite do meu corpo. Preferi correr sem camisa, mesmo na chuva para não ter que ficar trocando, agora o tênis não teve jeito usei 4 pares e acertei em usar o de tamanho maior no fim, pois os meus dedos estavam inchados e doloridos. Parei bem pouco para comer no nosso KG, quando parava comia rápido ou pegava algo que os Anjos (Liana, Débora, Erika e Fabiana - bem definido pelo Franz) davam e continuava correndo, a organização colocou muito líquidos e frutas para os atletas, além do macarrão e arroz em pratinhos que dava para comer enquanto caminhava.



Com o passar das horas, a pista parecia ser cada vez maior, as voltas demoravam mais, ai é que a cabeça tem que estar preparada. Tive a oportunidade de sempre encontrar alguém da equipe Força Vegana e correr com eles, além do Ronaldo e Lucas no início, o Celso, o Jhonatan, o Rafa e o Diego que estavam na dupla, o Rodolfo, o Pedro e o Daniel que corremos juntos por muitas voltas. Correr com esta galera foi uma honra, e estou sempre aprendendo com eles, e as meninas guerreiras que sempre quando passava ficava incomodando elas. Essa força mutua da Família que formamos nos tiram de situações que parecem até irreversíveis.

As brincadeiras eram o ponto forte, ao passar pelo tapete de cronometragem, escuto alguém gritando - "Vai Jesus!", olho para o cara e dou um sorriso, conto para o Digo e na outra volta o nosso camping inteiro começa e me chamar de Jesus, é vou me lembrar que não posso contar nada para ele, mas ele foi guerreiro ficou o tempo todo acordado e dando força sempre que passava, além da Cris (esta é doida varrida) que passou o aniversário dela conosco, e até parei na madruga para comer um pedaço de bolo de aniversário que rolou. O Venâncio sempre me motivando e gritando para correr mais e a Julia que só sabia me zoar e deu até uma volta comigo, mas consegui um abraço dela mesmo eu estando todo suado, argh!! A Fabiana e a Erika sempre lá dando força a todos, e a Liana e a Débora sempre se mostrando preocupadas e oferecendo comida.



A pista estava muito vazia na madrugada, cheguei a correr quase uma volta inteira sem ver ninguém, tinha galinha, coelho e ganso em grandes quantidades, um ganso até veio pra cima querendo me picar, se tivesse conseguido, já era a prova, ao passar por debaixo de uma árvore senti um pingo, sera que uma galinha fez coco em min?? Olhei e não vi cor e nem cheiro, vai saber, estava tenso, cheguei a chorar em algumas voltas, não sei explicar o motivo, não era dor, nem medo, era uma sensação difícil de explicar, vou ficar devendo uma palavra melhor para este momento. Vi até vulto, acho que aquele parque é assombrando, vai saber com um monte de maluco lá, isto deve atrair. Quando deu uma hora da manhã completei 100 km. Consegui, mas não vou parar, quem sabe dá 150k, para comemorar corri duas voltas com um chapéu imenso do Mickey, até escutei uma pessoa dizendo - "ai tá tirando, eu não to conseguindo nem correr e ele esta com este chapéu imenso", hehe, comecei a correr mais rápido.

Usei os massagistas 4 vezes, nas duas primeiras vezes pedi as massagens nas coxas (adutor e abdutor) e para falar a verdade não senti muita diferença, e nem achei que fosse usar de novo, mas de madrugada o Jhonatan falou que eu estava andando que nem zumbi, todo torto, meus joelhos estavam doendo muito e não estavam aguentando o peso do meu corpo, com isso minha lombar ficava sobrecarregada, causando dor nela também, como estava andando na primeira parte da pista e correndo na segunda, conseguia correr mas ao andar sentia muita dor e não conseguia ficar ereto, eram quase 2 horas da manhã já haviam passado 16 horas, tinha que parar para descansar e ver se a dor passava, nesta hora fiquei com medo que talvez não terminasse a prova, mas não queria parar, então fui no massagista que era outro, pois havia revezamento deles (para minha sorte), e perguntei se ele conseguia dar um jeito nos meus joelhos e lombar, depois de ficar 5 minutos na banheira de gelo e receber uma massagem muito dolorida me senti inacreditavelmente renovado, não estava sentindo nada, conseguia correr a volta inteira. A prova estava recomeçando.



São 6 horas da manhã, já amanheceu e parece que não vai chover mais, faltam 4 horas, o dj volta a tocar e coloca mais uma trilha do Rocky Balboa, não vou discutir as músicas que rolaram durante a corrida, pois foram de diversos gêneros musicais, mas quando tocou Menudo, foi divertido. Algumas pessoas começam a acordar e voltavam a pista, acho que por ter ficado na pista devo ter acumulado bons quilômetros, não estava pensando na classificação, pois no telão a posição não estava correta, só o número de voltas e os kms que estavam, então continuei correndo somente para a minha meta pessoal.

A partir deste momento a única dor que incomodava era nas canelas, estava conseguindo correr quase como se fosse o começo da corrida. Fiz várias amizades durante esta longa jornada, outras pessoas que como eu estavam lá apenas para correr, o Felipe Alves, o Misa Almeida e Wellington Camargo, o Itamar Bernardineli, e o Delino Tomé, conversamos nos demos forças, nos empurramos. O Paulo Fanti que estava fazendo apoio para o Jose Luiz também ajudou muito, o motorista da van da nossa equipe que veio do Sul, o Pedro que correu junto com as meninas na madrugada, pessoas de outras equipes, como o do Branca que sempre davam palavras de apoio e até a galera da organização, fazer Ultra desmente o fato que correr provas de corrida é cada um por si, todos se tornam uma família só. O Franz que apareceu lá no sábado a tarde e domingo de manhã, sempre perguntando se estava bem, se queria alguma coisa e dando força, fez até um pratinho de comida enquanto trocava meu tênis. Estes atos fazem muito a diferença. Te da segurança e obrigação de fazer o seu melhor!



O Diego e o Rafa estavam disputando a primeira posição nas duplas e precisavam acelerar, como eu também queria bater minha meta comecei a forçar. Por duas voltas quando o Rafa se aproximava e gritava - "Vamos", corríamos juntos e fortes, mais fortes mesmo, em um momento que ele pediu para eu puxar e tinha um transito enorme na nossa frente, fui fazendo zigue zague e acelerando, cheguei a escutar um - "Nossa, que isso!", mais tarde o Diego disse que falaram que tínhamos comido alface envenenada, hehe, a dupla que estava em segundo não aguentou e começou a andar, quando vi vibrei, este primeiro lugar é deles, ninguém tira, mas os loucos continuaram acelerando.

Encontrei com o Itamar, ele esta treinando o ano inteiro para a BR, e faltando cinco dias para a Valinhos se machucou, mesmo assim veio e com dores estabeleceu uma meta e mesmo correndo e andando foi atrás dela. quando passei por ele perguntei quanto faltava, para a minha faltavam 3 voltas e para ele 4 voltas, então disse - "Vamos juntos, esta ninguém tira de nós", em um ritmo bom fomos juntos, ele corria puxando a perna mas fez as 4 voltas, e depois ainda mais. Outra surpresa muito agradável no final foi o Daniel Meyer que sentiu durante a prova, mancou muitas voltas e voltou a correr e forte como um alucinado (no seu normal). Na penúltima volta eu, o Rafa e o Daniel fizemos uma volta muito rápida juntos, era para fechar com chave de ouro, agora na última volta senti uma dor imensa na canela esquerda, fiz mancando e cheguei no final cansado, com dor e muito mais muito realizado com toda a FAMÌLIA VEGANA lá para curtimos juntos.

As meninas, Eloisa, Bianca, Ketilin e Maria Angela subiram no pódio, o Pedro, Daniel, José Luiz e Lucas também subiram, além do Rafa e do Diego nas duplas, todos tinham certeza que eu subiria, eu mesmo não tinha esta certeza, mas quando escutei meu número (29) anunciado como 3º colocado na categoria 40-44 anos (com 156,350 Km, sendo o 11º no geral), ai sim acreditei. 

 

Foi legal? Foi! Mas sem demagogia o que mais te deixa satisfeito e realizado é o reconhecimento das pessoas que estão ali, o parabéns de toda a nossa equipe, dos outros atletas e de suas equipes, e do pessoal da organização, ter o respeito destes Monstros vale mais que qualquer medalha e/ou troféu ganho.

Quantas vezes nesta loucura de vida não nos pegamos pensando em como o dia é curto e que teria que ter mais de 24 horas para podermos fazer tudo que queremos... Bem neste dia as 24 horas foram suficientes para as realizações significativas!

Momentos como esse são eternos, só espero nunca perde-los!